Inteligência emocional: gerir emoções disruptivas em situações de crise
A paisagem quotidiana dos dias turvos em que hoje vivemos é o tumulto emocional. Vivemos o dia-a-dia num carrossel anímico de emoções desencontradas, onde a dominância é a sensação de que, como está inscrito num verso de uma famosa canção de José Mário Branco, “há sempre inquietação, inquietação; há sempre qualquer coisa que está para acontecer (…) ”; com a agravante de que é grande a probabilidade de que o que está para acontecer possa ser (ainda) pior do que já aconteceu antes.
Uma tal situação constitui um terreno fértil para o desencadear de estados emocionais disruptivos, que ocorrem quando certas emoções negativas são vivenciadas com uma intensidade tal que se manifestam desordenadamente, “escapando” completamente à nossa capacidade de controlo consciente e voluntário.
De acordo com a neurofisiologia do cérebro humano, o que acontece nessas situações é que “amígdala”, uma glândula situada na região do hipotálamo e que é considerada o “ radar neuronal da ameaça”, percebe os estímulos externos como de tal perigosidade para a integridade pessoal do indivíduo que realiza uma autêntica “pirataria emocional” através de um “sequestro do córtex”, que é a região do cérebro responsável pelas decisões conscientes. A consequência é que o comportamento da pessoa, em vez de ser uma escolha ponderada em função das circunstâncias, fica completamente dominado por impulsos emocionais primários, gerando aquela situação tão típica conhecida como “perder a cabeça”.
A probabilidade da ocorrência de processos emocionais deste tipo aumenta na razão direta da perceção de perigo que cada pessoa experimenta.
Mas como a perceção de perigo numa determinada situação, não tem uma relação direta e linear com a situação em si mesma, mas também, e até fundamentalmente, com as características pessoais de cada um, daqui decorre que nem todas as pessoas reagem da mesma maneira às mesmas situações.
Por isso, e quando confrontados com situações externas objetivamente gravosas, como é o caso da presente crise que vivemos, e que em si mesmo são potenciadoras do eclodir de disrupções emocionais, é fundamental pôr em ação uma das competências que o Fórum Económico Mundial tem vindo a considerar como uma das “big ten” para os anos vindouros (e isto ainda no período pré-COVID-19): refiro-me, como é óbvio, à “Inteligência Emocional”.
As diferenças nas vivências emocionais das pessoas quetêm ou não têm esta competência atualizada, são muito sensíveis e manifestam-seclara e objetivamente nas relações instrumentais dos comportamentos dessaspessoas com as situações.
Assinalamos alguns exemplos:
- As pessoas com um nível elevado de Inteligência Emocional conseguem manter a calma, a compostura e uma atitude construtiva perante as adversidades;
- Focalizam-se dominantemente sobre o que “ainda não aconteceu”, não numa atitude de angustiada premonição fatalista, mas na atitude proativa de “ir ao encontro dos acontecimentos antes que os acontecimentos venham contar nós”;
- Centram a sua atenção e a sua energia daquelas coisas que estão diretamente sob as suas zonas de influência; são “parte da solução” e não “parte do problema”;
- Têm mais recursos para controlar as tendências descontroladas da sua “mente macaco”, donde emanam as ansiedades dos “e se…”, os “estou feito…” e os “e agora?...;
- Encontram mais facilmente estratégias para contornar as tendências de sentirem transtornos de tipo obsessivo-compulsivo, como, por exemplo, sentirem-se o locus dos sinais clínicos tipificados de uma doença;
- Mantêm-se focados em propósitos maiores e são mais resilientes em ambientes de grande ambiguidade e incerteza.
Para aqueles que, perante isto, exclamam "OK…mas como é que se consegue?", acrescento apenas que os neurocientistas nos mostram que a neuroplasticidade do cérebro permite aos seres humanos modifica-lo através do treino e da experiência.
Por isso, e considerando as circunstâncias atuais, talvez não seja despiciendo afirmar que estamos num momento oportuno para o fazer.
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